quinta-feira, 21 de maio de 2009

Vila-Matas


Fui inundado, não pelas chuvas nordestinas, mas pela literatura. E também não por uma literatura qualquer, e sim, pela literatura que se assemelha ao lavor de joalheiro de, Enrique Vila-Matas. Disse que fui inundado pois o que sai dos livros de Vila-Matas toma de assalto qualquer pequeno espaço, qualquer lacuna artistica existente; eu explico. Durante a última semana e meia, não li os jornais, não fui ao cinema, não passei na porta de exposições, me lixava para deputados, e mais ainda para a opinião pública. Se pudesse, deixaria de trabalhar (é, reconheço que isso não seria esforço algum), somente para me afogar ainda mais nas palavras fluídas de Enrique Vila-Matas.

Comecei despretensioso com um livro emprestado por uma amiga: Bartleby e companhia, que segundo a mesma, era um livro viciante, que eu carregaria para todo lugar. "E ah, Thiago, tome cuidado para não perdê-lo", foram suas últimas palavras depois de deixar em minhas mãos a edição caprichada, da sempre esmerada Cosac & Naify. Duas noites depois, fui acordado por uma ligação dessa amiga, querendo saber o que estava achando, interessada em uma posição sobre minhas primeiras impressões da literatura Vila-Matense. Notei um desanimo fugidio em sua voz, depois da resposta pouco entusiasmada: Porra, eu tinha acordado naquele instante, não dava para dar gritinhos à BBB. Mal ela sabia que dormia com o livro sobre o peito e o indicador entre duas páginas marcando o meu progresso.

Se os leitores notam algo de familiar no título do romance de Enrique, talvez seja porque o tal Bartleby é um personagem de um livrinho menor do autor de Moby Dick. A mesma amiga me emprestara em época muito perigosa as desventuras do funcionário inoperante que fora Bartleby, gostei do livrinho na época, ainda mais por poder dizer que já havia lido Melville sem ter precisado enfrentar as toneladas de Moby Dick. Mas Vila-Matas eleva a criação de Herman ao patamar da mais alta e moderna literatura pintando um mosaico de impressões sobre literatura e realidade impactante e comovente. O livro é uma declaração de amor a literatura e ao ato de escrever, belíssimo. Saí da leitura do romance com muita vontade de ler outro Vila-Matas era realmente uma dependência, tanto que fui até a livraria e não fiquei a esperar o correio com a caixinha do livro encomendado pela internet, que é a maneira que costumo comprar livros. Fui a livraria e adquiri: A viagem vertical.

A essa altura já estava com a felicidade que somente um banho de chuva de verão na infância conseguia me provocar. A leitura é muito estimulante, tanto pelas remissões literárias, quanto pelas sacadas ironicas e divertidíssimas. E eu ainda não tinha nem saído da livraria. Na realidade, toda essa alegria se dava por encontrar elementos familiares na obra do catalão, como o próprio banho de chuva que o protagonista -- Mayol -- de A viagem vertical toma sem ao menos se preocupar; a preguiça de ir ao cinema, viagens, Lisboa, Açores, Barcelona, Walter Benjamin, Fernando Pessoa, a bebida (e a distância dela). Todos os ingredientes da sua obra me cativam, e ainda são abordados de uma maneira magistral, do jeito que eu faria, se fosse mais inteligente e tivesse talento. Estou aprendendo espanhol para poder ler tudo que Vila-Matas escreveu sem precisar ficar à mercê da Cosac & Naify ou das tenebrosas traduções portuguesas.

Um comentário:

  1. bacana, thiago. nao conheço o vila-matas e vou procurar já.

    esse bartelby, o do melville, foi comentado pelo sr deleuse que viu nele A resistencia. de fato. mas ainda prefiro moby. e recomendo!
    abço!

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